Guarda-chuva

No ponto de ônibus, eu de guarda-chuva, você desprotegida. Sentias o frio das gotas com vento lançadas sobre seu rosto. Com curto decote, as águas do céu derrubadas, serpenteiam como rios. Vão em direção a ponta dos seus seios. Na natureza formaria um vale. Ali, por debaixo da blusa preta, vejo o arrepio do frio na pele sua e tenho invejo das gotas da chuva.
Uminha, queria ser uminha delas. Isso bastava. Cairia, ao invés das que correram pelo seu busto, 2 centímetros abaixo do seu umbigo.
Eu vi o começo da sua tatuagem e fiquei curioso.
Eu rolaria, usando a volta da sua barriguinha para ganhar velocidade. Embalaria. Com o cós baixo da sua calça entraria sem ser barrado por seguranças. Seguiria o caminho da tatuagem tribal, mesmo se fosse preciso entrar calcinha a dentro.
Todas outras gotas se divertem nos rios do seu busto. Eu, sozinho, me aventurava no seu escuro, tendo como teto a renda artesanalmente costurada.
De repente, o barulho do raio me faz deixar de ser gota, me sinto de novo humanamente estúpido, grande e inútil perto da elasticidade e mobilidade da gotinha.
Meu ônibus chega.
Deixo então, para ti, o guarda-chuva que havia acabado de comprar na barraquinha do Paraguay.
Você, assustada com o inusitado, faz cara de surpresa.
Me agradece.
Ao subir o primeiro degrau do coletivo, sem querer me entrego, elogiando sua fênix tatuada.
Causo em ti mais espanto que a tempestade que chega.
A água dos seus olhos quase vira o barco que ancorei por lá segundos atrás.
Lá dentro de ti estava quente. Aqui fora a solidão é como neve.
Resta-me agora suforcar dentro desse ônibus lotado, com janelas embaçadas pela falta de vento.
E ter mais um transtorno obsessivo compulsivo, olhar os guarda-chuvas das mulheres que pegam ônibus.