quarta-feira, 4 de março de 2015

A carta

Ele postou uma carta que falava do início da primavera.
Ela nem bem havia chegado ainda, mas tanto queria e tanto a desejava que escreveu.
Só havia um pássaro em toda a cidade.
Mas tanto queria e tanto a desejava que ouviu mais que um cantando.
Olha ali, ela vem chegando!
As pessoas riam. Estava tudo nublado ainda, chovia, mas ele insistia.
Veja o sol, está indo embora mais tarde!
Queriam medir sua temperatura na testa.
É delírio, diziam.
Incrédulos, todos riam.
Veja, essa flor aqui se abriu ontem!
E nada, ninguém acreditava.
Ficou triste, mas por dentro riu sozinho, pois a sensação de ver o que ninguém via, dava-lhe certo alento.
Estava já tão sem crédito que quando gritou que as amendoeiras haviam florido, bocejaram.
Mas, elas estavam ali, brancas e rosadas por dentro, delicadas a explodir numa sinfonia sensual.
A carta atrasou e atrasou. Nada de chegar.
E cada palavra que escreveu na carta foi se desenhando na sua frente.
Foi ela quem lhe disse que a primavera chegaria e que seria lindo.
E foi ao escrever e falar que ela chegou.
A primavera antes da carta.
Nada me tira da cabeça, porém, que o início dela se deu quando pegou a caneta e escreveu a carta para ela.
 

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