domingo, 30 de novembro de 2014

Sobre os amores líquidos

Vivemos tempos estranhos. A publicidade na qual todos nos vemos metidos e as formas de comunicação instantânea faz com que tenhamos mais medo de perder o celular do que a própria carteira ou a chave de casa.

Sem o celular eu não sei o número de ninguém para ligar, não tenho como mandar um uatizap, não sei onde fica um orelhão, muito menos tenho a coragem de pedir um outro telefone emprestado a um desconhecido na rua. Somos extremamente comunicativos em nossos pcs, smarthfones, ipads e cada vez menos fora dele.

O filme argentino Medianeiras trata disso de uma forma singela e bonita. O filme ELA, com uma performance arrasadora de Joaquim Phoenix, também. Ao mesmo tempo em que somos cada vez mais ágeis em nos comunicar nesses meios, ainda sofremos dos mesmos dramas da época do telefone que você tinha que puxar um círculo com os números.

Desenvolvemos afetividades através dessas redes e entre quatro paredes ou num inbox nos desnudamos. Tiramos o véu do que há de melhor e o de pior em nós mesmos. Demasiadamente humano. Choramos no uatizap, gozamos em um chat. Desenvolvemos e frustramos expectativas. É a nossa intimidade, apenas nossa intimidade. Trocamos de fotos a sentimentos. Buscamos todos sair da solidão ou apenas passar o tempo.

Nesse mundo em que tudo se torna público, começamos a achar normal exploração da intimidade alheia, a execração pública e a destruição de personalidades com um simples propagar de um enter.

Pouco me interessa o que as pessoas fazem em seus quartos, em seus chats ou nas redes sociais. Pouco me importa a forma como elas amam ou fantasiam o amor.  Eu só quero que elas amem e tentem ser felizes em um mundo tão estranho como esse.

Estranho a ponto de se sentir verdadeira pulsão em “revelar” ou ler a intimidade alheia. As pessoas começam achar normal destruir laços afetivos, criar estigmas e carimbar para todo o sempre o outro. E a melhor forma forma de banir alguém do mundo virtual é expor sua intimidade.

Em 2011 o jornal britânico News of the World, de Rupert Murdoch, teve sua última edição publicada, após ser acusado de acessar ilegalmente a mensagens de celulares de mais de 4.000 pessoas. Na época nos indignamos e se pensou que esse tipo de invasão tivesse acabado.

Infelizmente, não foi o que ocorreu. Hoje, com as redes sociais, estamos a um enter de nos transformarmos em News of the World ambulantes.

Notícias do mundo particular. Dos amores, das fantasias e das dores que só pertencem a quem, num belo dia, resolveu sair do deserto que às vezes nos encontramos. 

Um comentário:

Unknown disse...

Bauman já explicou isso, sobre o conectar e desconectar da rede, e como os laços humanos são minados pelas redes sociais ... Mas ficou bacana a sua conclusão.